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De: Ana Júlia Sança
Quando a minha amiga Fátima Toste me fez o convite para
estar presente neste evento, eu não pensei duas vezes para
dizer "SIM" a tão honroso pedido.
Primeiro, porque eu tenho uma dívida para com os Açores
e o seu Governo, que tão amavelmente me endereçou
por dois anos consecutivos, convites para participar no Curso
"A Descoberta das Raízes" e muito recentemente
para o Primeiro Encontro de Organizações Sociais
das Comunidades que tanto enriqueceram o meu conhecimento, e me
deram a oportunidade de ver e sentir de perto a forma de vida
das gentes das Ilhas.
Segundo e com muito mais razão, eu amo os Açores
e suas gentes.
Açores!
Como eu gostaria de dizer agora, meu arquipélago adoptado,
Óh como eu aprendi a amar-te....
Este meu sentimento ilhéu não passa despercebido,
penso eu, e só por isso, eu gostaria de vos repetir o que
a minha alma tem para dizer.
Em 1992 quando pisei os Açores pela primeira vez, levada
por um grupo de açoreanos da Diáspora, pude comungar
e partilhar com os meus irmãos aquilo que nos é
comum- A Língua Portuguesa, a Insularidade, a Cultura e
sobretudo este espírito ilhéu.
E a recordação dessa visita nunca mais foi apagada
por outras feitas mais tarde. Foi de facto, uma jornada inolvidável
de agradada surpresa que a beleza das vossas ilhas, que hoje considero
minhas também por opção, me causou, de caloroso
afecto que me rodeou.
E devo dizê-lo já, foi o começo de uma grande
admiração pelo vosso espírito de grupo, o
vosso sentido de tradição e de partilha, a vossa
fidelidade aos valores herdados dos vossos "NOSSOS"
antepassados.
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No ano 2000, num curso promovido pela Direcção Regional
das Comunidades, "À DESCOBERTA DAS RAÍZES"
concorri e tive a oportunidade de ser seleccionada. Voltei novamente
a visitar pela segunda vez as Ilhas Açoreanas.
Fui descobrir raízes que eu desconhecia, fui experimentar
o doce sabor das ondas nos meus olhos, a força telúrica
nas minhas veias, sentir o odor das hortênsias ladeando
os caminhos, fui ver outras flores enfileiradas pelas encostas
embelezando o cenário num colorido multicolor que me deixou
extasiada, maravilhada, e não resisti, escrevi este poema
que eu dediquei à ilha de S. Miguel:
S. Miguel, minha Ilha de sonho
Contornada de verde por esperança
Meu jardim de âmbar florido
Plantado no meio do Atlântico
De lagoas brandas multicolores
Regadas com lágrimas e memórias
Onde os meus olhos naufragantes
Visualizam os corredores da minha infância
Aqui no meu peito, eu celebro-te
Neste canteiro de brumas macilentas
Eu invoco-te
Meu cenário legendário de vulcões
De gaivotas, baleias e hortênsias
De homens do mar e mulheres do campo
De coração deserto, sempre aberto
Minha ilha às vezes distante
Porque me pões a pensar, e me fazes questionar...
Que ilha é essa
Que eu procurei a minha vida toda
Sem saber que habitava já em mim?
Junho 2000
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Vivi dias inolvidáveis nas ilhas de S. Miguel e Santa Maria.
Mas como tudo o que é bom acaba depressa, lá tive
que regressar de novo à base para a minha vida quotidiana
com o coração latejando. A saudade e as recordações
eram constantes no meu dia a dia. E como a minha fé de
um dia regressar era tão grande, depressa chegou-me um
novo convite para participar numa reciclagem do curso anterior.
MARAVILHA!!! Senti um chamamento dentro de mim, uma cumplicidade
indiscritível que só se sente com o próprio
coração.
Ano 2001. Voltei para aprender os Açores pela terceira
vez. Era já uma realidade. Não era eu a viver as
ilhas. Elas viviam já dentro de mim sem eu saber.
COISA FANTÁSTICA!
Sim voltei. Eis-me de novo em romagem de saudade naquelas ilhas
tão queridas, onde muitos de vós aqui presentes
experimentaram um dia a alegria do regresso aos lugares em que
decorreram as vossas infâncias e foram felizes. De novo
pude comungar com aquela boa gente aquele bom acolhimento e o
bom trato que sempre me dispensaram.
Sim pela terceira vez visitei pela primeira vez a Ilha Terceira.
Foi amor à primeira vista. Fiquei inspirada, não
pude conter o impulso do coração e escrevi este
poema:
Terceira
Ilha renascida entre fanfarras e touradas
De gente alegre e divertida
És então a minha ilha Terceira
Do Monte Brasil , e do Pátio da Alfandega
dos repentistas e cantadores
de olimpicos brilhos poeticos e bailados
Desde a Serreta ao Pico das Cruzinhas
O Bailhão das paródias e das noitadas
Minha Ilha lilás perfumada de flores e maresia
És o caminho de lava, és a doçura ...
Ilha de Nemésio, ilha efémera
Junho 2001
Mas não parei. Fui sempre chegando as outras ilhas, sempre
com a mesma alegria e paixão.
No Pico fiquei fascinada com a beleza e o segredo daquela ilha
encantadora tão cheia de mistérios envolta nos seus
currais de maroiços. Não resisti e escrevi mais
uma prosa poética a qual dediquei à minha amiga
Drª Aida Baptista, companheira de quarto durante a minha
estadia nos Açores.
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Hoje dia 29 de Junho de 2001, acordei com uma lua cheia luzindo
pelas frestas do cortinado em busca de mim para beijar o meu rosto.
Era uma grande bola e enorme era o seu brilho que a minha retina
de tanto embalar se despiu de emoção e ganhou distâncias
afeiçoadas por um murmúrio gentil de metáforas
entre as quatro paredes do meu quarto.
Éramos apenas nós as duas, o silêncio da noite
e a cumplicidade daquela luz, ora ouro, ora prata e outras vezes
com um cintilar de fogo quase sagrado.
Ganhei asas. Eu era gaivota levada pelo destino da noite que num
rasgo de solidão, eu perdia-me em miragens de memórias.
Sentia-me como um barco já desancorado almejando novos
portos, em busca de novas odisseias.
Sobre o Pico de vulcões adormecidos, nem uma agulha bulia,
nem uma voz de temor, nem o cântico dos grilos entre o negrume
dos pedregulhos se ouviam, apenas o extenso manto prateado da
Lua Cheia, na calmia do vento, desafiava lentamente o meu olhar
que pouco a pouco se distanciava como em liturgia de saudade ao
comparar este destino ao das algas, do salitre ,quando os tufões
desencadeados, arrastam para a cruz, o calvário de todos
os mares.
Por um momento, não sei se chorei, não sei se rezei.
Invadia-me uma fé antiga, quase pré-histórica,
pensei então nas crenças do mundo, no sofrimento
dos fiéis e mais as minhas dúvidas. Sim, as minhas
dúvidas.
E porque dentro de nós, qualquer oração é
permitida, ali na ilha iluminada, entre quatro paredes em silêncio,
uma alma resvalava no ritual do sono justo, enquanto eu, numa
Avé Maria balbuciava,
ROGAI POR NÓS
ÓH SENHORA DA BOA GUIA
Para que com a mesma ânsia te compadeças deste povo
que também é meu irmão e faças com
que este luar, seja o candeeiro do mundo e a consciência
das gentes das Ilhas.
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Visitei o Faial e São Jorge. Cada qual com a sua beleza
natural seus costumes e encantos, mas todas porém com tanto
para dar, porque os Açoreanos sabem estar na vida e tão
bem cativar os seus visitantes. Não é por acaso
que Vitorino Nemésio escreveu o seguinte: " O Verbo
estar é muito mais verbo para um ilhéu do que viver"
E eu parafraseio alguém que disse ainda "NÃO
HÁ GENTE COMO A GENTE"
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E agora num plano mais filantropo, gostaria de vos dizer que acabo
de chegar novamente dos Açores, mais propriamente da Ilha
Terceira onde estive num Encontro de Organizações
Sociais das Comunidades, promovido pela Direcção
Regional das Comunidades. Numa missão humanística
de cariz social, fui aprender de novo as várias facetas
do Povo Açoreano num intercâmbio cultural e social
com elementos da diáspora que vieram alargar mais os meus
horizontes para uma compreensão mais acertada em relação
ao próximo.
Queria também deixar aqui expressa a minha enorme gratidão
pelo povo das Ilhas agradecer com veemência à Srª.
Directora Regional das Comunidades, Srª Drª Alzira Serpa
Silva e à sua excelente equipa de trabalho, pelo grande
esforço na divulgação das Ilhas em vários
níveis culturais e sociais que têm engrandecido o
Arquipélago em prol das suas gentes e não só,
e ainda agradecer aos meus colegas que fizeram parte desse Encontro,
todo o apoio que me deram durante o tempo que permanecemos nos
Açores e dizer que nós só seremos grandes
quando tivermos em conta o direito de igualdade para com todo
o ser humano.
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Meus amigos, este é um apelo de uma pessoa que não
sendo Açoreana, e que tem um apego tão grande às
vossas ilhas, vos diz:
Apesar de sentir os Açores nos vossos pensamentos e nos
vossos corações, apesar da convivência ao
redor de uma mesa em convívio gastronómico, saboreando
deliciosa alcatra, massa sovada, sopa de peixe, etc. apesar de
atentamente escutarem, em ciclos e conferências, estórias
da vossa História, apesar das cerimónias religiosas
, das bandas, das musicas, dos bailhos, apesar de tudo isso, um
pedido vos quero fazer aqui hoje:
Não descurem a língua Portuguesa , pelo menos no
âmbito familiar, e mantenham a vossa tradição
a vossa cultura sempre vivas, porque esta é a principal
riqueza de um povo.
Agora que estou a chegar ao fim, quero celebrar convosco esta
data histórica da CASA DOS AÇORES EM TORONTO, e
agradecer a oportunidade que eu tive de compartilhar convosco
esta minha experiência das minhas visitas à vossas
(nossas) ilhas. Desejo a todos as maiores venturas e uma vez mais
os meus parabéns à Casa dos Açores por esta
iniciativa, faço votos para que continuem a celebrar sempre
a Semana Cultural Açoreana com muito sucesso.
Obrigada Fátima, Obrigada Sr. Faria, para
todos vós o meu beijo de basalto.
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