ERMELINDO ÁVILA - Património do Estado

Não é somente o Património municipal ou o particular que está degradado nesta vila. O Estado ou a Região também tem por aí as suas mazelas, testemunhos da incúria, do desleixo ou do desinteresse que os poderes públicos votaram esta vila que, por si, pelo seu traçado urbano, pela sua antiguidade e a sua história, devia merecer um tratamento mais digno da própria terra e dos gestores públicos que, assim, mostram desmazelo, falta de interesse e abandono dos valores à sua guarda.
Na década de trinta o Ministério das Finanças adquiriu nesta vila um excelente prédio, antiga residência do Visconde de Leite Perry, para instalar os serviços alfandegários. O prédio foi, então, remodelado e convenientemente mobilado para residência do respectivo funcionário. Até a sala de jantar recebeu os serviços de louças e vidros adequados. Ignoro se alguma coisa existe.
Com a extinção dos serviços alfandegários, no edifício passou a funcionar a Guarda-Fiscal e durante alguns anos assim se manteve até que aquela organização foi incorporada na Guarda Republicana e concentrada no Cais do Pico. O edifício ficou deserto. Do frontispício desapareceram as placas identificativas. O prédio entrou em degradação até que há meses a Junta de Freguesia, que apressadamente demoliu o seu prédio sede para ali levantar um novo edifício (?), instalou-se no antigo escritório do rés-do-chão da Alfândega.
Da Junta resta o espaço, onde estacionam dois ou três automóveis. A antiga alfândega está praticamente desocupada. E a destruição continua.
Os serviços de Finanças, instalados no antigo convento franciscano, entregue à Câmara em 3 de Janeiro de 1840, para nele “se estabelecerem as Repartições Públicas”, estão deficientemente acomodadas, ocupando corredores e tornando o magnífico edifício franciscano, infuncional e inestético.
A Câmara Municipal já ocupou corredores e archetes para arrumar serviços e arquivos.
Era tempo de se definirem propriedades e de instalar no antigo edifício da Alfândega os serviços municipais, porque o espaço o permite, ou, então, os serviços da Repartição de Finanças, de menor dimensão.
Seria a forma de dar uma ocupação condigna ao excelente imóvel, situado no centro da Vila e um dos melhores edifícios do burgo, com um frontispício elegante e de certa majestade.
Mas que dizer do edifício da Delegação Marítima, esse completamente votado ao abandono, sujeito a infiltrações de águas e a derrocada iminente? E ali há valores que merecem e devem ser acautelados, como sejam os arquivos dos serviços marítimos da Ilha.
Em artigo publicado em “O Dever” de 27 de Novembro do ano findo, tive oportunidade de chamar a atenção para o estado de abandono em que se encontravam (e encontram!) os edifícios públicos da vila das Lajes. E referindo-me à delegação marítima dizia que o edifício fora desactivado e os serviços centralizados na Delegação de S. Roque. O edifício, como disse, não recebe a conservação devida e qualquer dia será mais um mamarracho a contribuir para a degradação da Vila.
O porto das Lajes, em virtude do desenvolvimento da prática do “Whale Watching”, tem um movimento de turistas de alguns milhares por ano. Possui, para a prática dessa actividade desportiva, quase três dezenas de embarcações de diversos tipos, além de mais de duas dezenas de embarcações de pesca costeira. Tudo isso traz ao porto um movimento interessante que merece ser devidamente fiscalizado, não apenas por agentes da polícia marítima que, furtivamente, aqui aparecem para uma fiscalização repressiva.
Há necessidade de restaurar a Delegação Marítima das Lajes do Pico. A despesa da sua manutenção não aumentará as despesas do Estado, pois bastará o destacamento de um oficial, que os há nos Serviços Centrais. Seria a entidade que velaria pelo edifício, um bem precioso do Estado, construído há umas três dezenas de anos em terreno cedido pela Câmara Municipal e optimamente situado.
E ficamos hoje por aqui. Mas voltaremos ao assunto. É que o Património do Estado é o Património do Povo, que para ele contribuiu. As entidades oficiais são somente zeladoras desses bens e devem exercer essa missão com dignidade e responsabilidade.

Setembro 2004

Ermelindo Ávila