A Descoberta do Canadá pelos Portugueses Antes do Nascimento de Colombo - Conferência de Dr. Manuel Luciano da Silva


Conferência do Dr. Manuel Luciano da Silva no Consulado-Geral de Portugal em Toronto em 14 de Março de 2002

No dia 14 de Março de 2002 realizou-se no Consulado-Geral de Portugal em Toronto pelas 17.30 a conferência "A Descoberta do Canadá pelos Portugueses antes do Nascimento de Colombo" pelo Dr. Manuel Luciano da Silva.

Perante uma sala repleta, conferência desenvolveu-se à volta dos seus temas preferidos, a Teoria Portuguesa e a Pedra de Dighton. Finalizou a sua intervenção com um dos seus componentes importantes referente ao Canadá, nomeadamente que os portugueses estiveram nas regiões da Terra Nova, Nova Escócia e a Ilha Príncipe Eduardo muito antes da viagem de Colombo em 1492. Baseando-se no mapa de Pizzigiano de 1424, o Dr. Manuel Luciano da Silva traça a rota dos marinheiros lusitanos às Antilhas, e Ilhas Satanazes para as actuais regiões da Terra Nova, Nova Escócia e Ilha Príncipe Eduardo, salientando que a configuração do mapa quatrocentista se coaduna com estas mesmas regiões. Com uma breve passagem pelo legado léxico português aos idiomas nativos da América do Norte, desemboca na origem da palavra Canada. Dando como certa a presença dos irmãos Corte Real por estas paragens e na costa leste americana em Massachusetts, Nova Inglaterra e Maine, propõe que a palavra provém do nome das propriedades que o pai dos Cortes Reais, João Corte Real, possuía em Tavira, ou seja a Canada (ou local das canas).

Numa abordagem acessível e salpicada de bom humor o Dr. Manuel Luciano envolveu a sua audiência nesta fim de tarde numa emocionante aventura pelo tempo. Inicia a palestra invocando a importância do papel da nação portuguesa no desbravar dos oceanos e terras além-mar, salientando que ainda hoje o coração do Atlântico mantém a sua designação portuguesa, Mar Sargasso. Invocou aquele que foi o grande impulsionador da empreendimento marítimo português, o Infante D. Henrique, chamando-o de pioneiro e primeiro proponente do conceito da Globalização e o papel preponderante da sua escola náutica em Sagres onde, no século XV, reuniu os melhores cartógrafos, astrónomos e cientistas, almejando a projecção da presença portuguesa pelo mundo. Aqui desenvolveram-se instrumentos e técnicas inovadoras de navegação empregadas nas célebres caravelas da odisseia portuguesa, inovações como a vela Latina, a primeira a navegar face aos ventos e que muito contribui para uma navegação mais veloz e eficiente dos oceanos. Fez-se menção da contribuição de Bartolomeu Dias à posteridade ao descobrir que as correntes do hemisfério norte circulavam no sentido dos ponteiros do relógio enquanto as do hemisfério sul em contra relógio, explicando, assim, o aparente desvio de rota efectuada pelo Vasco da Gama na sua primeira viagem à Índia como provável aproveitamento das correntes na dobragem do Cabo da Boa Esperança. Salientou que, no século XV os navegadores portugueses tais como os empreendedores irmãos Corte Real, já eram conhecedores da navegação em arco.

Prossegue com a apresentação da sua amante de há mais de cinquenta anos, a mui controversa Pedra de Dighton. Ao que parece, o Dr. Manuel Luciano teve conhecimento da sua existência por meio do seu professor de história quando aluno do liceu de Oliveira de Azeméis. Posteriormente, já imigrante e estudante na Universidade de Nova Iorque, deslocou-se ao Rio Taunton em Berkley nos Estados Unidos (na proximidades da Cidade de Boston) em 1949, quando a viu pela primeira vez. Colocada ao contrário há milénios nas proximidades da margem esquerda do rio pela movimentação de terras provocada na última época glaciar, o facto que a rocha se encontrava submersa durante 20 horas diárias, ficando a descoberto somente com a maré vaza, assegurou, em larga medida, a sua protecção de eventuais vandalismos e degradação. Com uma superfície de 55 pés quadrados e pesando 40 toneladas, sita em território pertencente em tempos à cidade de Dighton, actualmente Berkley, a Pedra Dighton apresentava características geomorficas distintas das demais formações rochosas da região.

O primeiro estudioso a debruçar-se minuciosamente sobre as inscrições foi o Professor Edmund Delabarre. Psicólogo e vivendo numa época em que a estudo da caligrafia era visto como uma chave à personalidade, Delabarre despende, a partir de 1913, imenso tempo e pecúlio a estudar a Pedra. Mas foi em 1918, enquanto examinava uma fotografia da mesma, Delabarre detectou uma gravura com a data de 1511. Encorajado pela sua descoberta, encetou a pesquisa de possíveis exploradores que tenham aportado aquelas paragens no século XVI, tendo chegado aos irmãos Corte Real, Gaspar e Miguel. Já em 1920, estabelece a presença de sete grafismos do nome Miguel Corte Real e o escudo português em forma de V. (A família Corte Real, oriunda de Tavira em Portugal, radicou-se na Ilha Terceira nos Açores. A localização estratégica da ilha no meio de Atlântico permitiu aos irmãos partirem para terras desconhecidas do norte em busca de fontes alternativas para a pesca do bacalhau, sendo o bacalhau salgado um dos principais géneros alimentícios e moeda de troca da população portuguesa da época).

O trabalho do Professor Delabarre no desenvolvimento da Teoria Portuguesa foi compensado pela atribuição da Cruz da Ordem de Cristo. Por altura da sua morte em 1945, Delabarre legou um pequeno terreno (250 metros), contíguo à Pedra de Dighton e mais tarde seria a pedra basilar da fundação do Dighton Rock Park (ou seja o Parque da Pedra de Dighton) e um pequeno montante destinado à preservação da pedra. Em vida organizou várias visitas peregrinas de Luso Americanos à pedra.

José Dâmaso Fragoso foi outro estudioso que se fascinou pela Rocha. Em 1948 anuncia ao conferencista que fizera um decalque da pedra onde detectou a Cruz da Ordem de Cristo, a qual se caracteriza pelo o ângulo de 45° das extremidades dos seus braços. (Os primeiros desenhos diagramáticos das inscrições na Pedra remontam aos séculos XVII e XVIII da autoria do Reverendo John Danforth e James Winthrop respectivamente). Em 1951, num artigo publicado na revista "Portuguese World" (O Mundo Português), João Fragoso descreve as três Cruzes da Ordem de Cristo e o escudo triangular português presentes na Pedra de Dighton. A Cruz da Ordem Cristo, Ordem sedeada em Tomar, acompanhou toda a odisseia dos achamentos portugueses, impresso nas velas de suas caravelas e padrões que assinalam as terras por onde os pioneiros lusitanos passaram.

Com a fundação em 1951 do Miguel Corte Real Memorial Society dá-se seguimento à obra de Delabarre. Uma sociedade composta por luso americanos o seu propósito era de adquirir os terrenos contíguos à Pedra e fundar o Dighton Rock Park e perpetuar a memória do explorador português, Miguel Corte Real. Em 1952 procedeu-se à compra de 50 acres de terreno e o parque fora oficialmente criado por decreto do Senado de Massachusetts em 1954. Em 1963 a Pedra foi removida do leito do rio e recolocada na sua margem. Uma vedação de arame oferecia parca protecção contra os actos de vandalismo efectuados pelos visitantes ao parque. Após uma longa e árdua luta de dez anos o Dr. Manuel Luciano logrou que as autoridades estatais de Massachusetts aprovassem uma verba de $50,000 para a construção de um pavilhão que albergaria a Pedra e constituiria um museu destinado a perpetuar a passagem dos índios, vikings, portugueses e outros povos pioneiros por terras norte americanas.

Na sua terra natal, Vale de Cambra, perto de Oliveira de Azeméis, o Dr. Manuel Luciano fundou ainda uma Biblioteca-Museu dedicada ao estudo dos feitos marítimos portugueses.

Várias vezes ao longo de toda a conferência, o Dr. Manuel Luciano incentivou os homens a perseverar na rota dos seus sonhos, invocando como exemplo a sua própria tenacidade no seu propósito de deixar ao mundo a Teoria Portuguesa e toda a verdade de um passado muita vezes votado ao esquecimento pelo nosso próprio povo.


O Senhor Cônsul de Portugal em Toronto, Dr. João Perestrello, deu por finda a conferência ao agradecer o Dr. Manuel Luciano em nome de todos os presentes a sua prestação.

De seguida, a Academia do Bacalhau de Toronto homenageou o conferencista ao propor que uma bolsa de estudos fosse atribuída aos jovens académicos lusos que queiram dar continuidade a esta obra, tão nossa, tão lusa, que é o registo da presença e contributo dos nossos ancestrais na formação do continente norte americano hodierno.
Parabéns, Doutor!