Manetas e Burros


Quando eu ainda andava nas ilhas, lembro-me que agente associava o têrmo “maneta” com uma pessoa de braço defeituoso ou sem ele. Ou então, aquela pessoa que não tinha uma das mãos. Usava-se igualmente a expressão “foi p´ró maneta” quando a gente pedia alguma coisa ou alguém do nosso conhecimento.
Porém, nunca sonhei que tal falatório popular remontava aos tempos da invasões francesas, perpretadas por Napoleão contra Portugal (1807-1810). Foi Jaime Martins, um jornalista que conheci em Lisboa e antigo colaborador de “A União” que me forneceu a informação, que a seguir passo a transcrever.
Aparentemente, um dos oficiais de Napoleão, cujo nome era Louis Henri Loison, havia perdido um braço na campanha de Helvécia (Suiça) Em Portugal, o passatempo favorito de Loison concentrava-se em dar ordens de prisão. E indivíduo preso, era indivíduo perdido.

Tanto assim, que, a partir daí surgiu e propagou-se o dito popular “foi pro maneta” que ainda hoje perdura como resultado da alcunha fixa, pelos portugueses de antanho, ao general “Maneta” Loison.
De facto, Loison tornou-se odiosamente notável pelas suas atrocidades, conforme o testemunho transmitido por Roby Amorim no seu “Elucidário de Conhecimentos Quase Inúteis”. Em Évora, por exemplo, Loison “fez cinco mil mortos e dois mil restantes prosioneiros, um número considerável foi passado pelas armas. “As atrocidades cometidas por Loison criaram o dito popular de ir p´ró maneta, como símbolo, um tanto ridículo de se aguardar um chorrilho de tragédias”.
Transitando agora a outro assunto, convêm acentuar que os burros também têm a sua história. Evidentemente que esta história não se apresenta sempre recheada de requintes primorosos, todavia, ela mostra-se cheia de humor burrical.
Por exemplo, quando alguém entra a berrar em violento protesto, agente imediatamente chama-lhe burro-casmurro, ou simplesmente “Tá asno!”
Embora o burro não passe dum quadúpede, em muitos casos o burro representa um símbolo, assaz, irrisório, usado em comparações, tresmalhadas, tais como “Pedaço d´asno e Cara d´asno”, bem como em análises atmosféricas: “Tá frio c´ma burro”.
Diz-se que um burro carregado de livros é doutor e que vozes de burro não chegam ao céu. Há quem prefira bom burro que ruim cavalo, e há quem diga “antes morto por ladrão que de coice de burro”.
Respeitando as regras da etiqueta asinina, devemos adicionar que o burro tem os seus direitos inequívocos, pelo menos esses de zurrar e morder, quando bem lhe apetece. Lembro-me dum incidente ocorrido nas ilhas, quando um camponês pretendia aparelhar um burro. O animal recalcitrou ferrando os dentes no braço do camponês, e só o olargou quando o homem recoreu a mesma arma, pregando-lhe so dentes no focinho até o burro espirrar sangue.
Recordo-me dum outro incidente presenciado num determinado aeroporto, precisamente quando o avião fazia a manobra da descida p´rá aterragem. O piloto foi acometido de arrepios ao enxergar um burro, todo pachorrento, atravessando a pista. Fácil de imaginar o alarido dos passageiros a bordo e do pessoal na torre de comando.
O embate foi inevitável e o espectro duma catástrofe fatal colheu toda gente com a mais profunda comoção e suores frios. Felizmente, o aparelho pouco sofreu na colisão, ficando apenas com o tem de aterragem danificado.
E o burro? Esse, coitadinho, foi p´ro maneta!

Tu não vistes mas eu vi
Um homem qu´era maneta,
Ter os olhos duma menina
Fechados numa gaveta.

Minha mãe, p´rá me casar,
Prometeu-me um burro branco;
Desde que me achou casada,
Diz que o burro estava manco.

Que mal fazia o meu burro
À porta do teu palheiro,
P´ra lhe cortares o rabo
P´ra raminho de cheiro?

Aquela Lomba das Telhas
Já não tem que namorar;
De dia, tudo são velhas,
De noite, burras a zurrar.

Norte Grande, burriqueiros,
Cada qual c´o seu burrinho,
P´ra ganharem um vintém
Andam sempre no caminho.

Rabo de Peixe tem proa
De ter boa novidade;
Vai um burro com cebolas;
Chega-te asno p´rá cidade.