Paragens Exóticas na Memória de um Vice-Rei


Senhor

1 - Louvado Noso Senhor que me deixou chegar a esta cidade com toda a armada que me Vossa Alteza entreguou a esta cidade com toda a armada a 9 de Setenbro. E porque he rezado daar conta a Vossa Alteza dalgumas cousas que ficão atrás e adverti lo do que cunpre a seu serviço me torno as Ilhas d'Angoxa onde abry o regimento de Vossa Alteza e fiz o que por ele me mandava que foy deitar o meu batel fora e manda lo ditas ilhas saber algumas novas de Moçambique. Isto fiz com o tenpo e ersguardo que conpria a serviço de Vossa Alteza mas nem isto bastou pêra deixar de correr risquo o batel en terra achou quem pelejasse com ele. Matarão os meus sete ou oito cafres sem da nossa parte se perder cousa alguma porque esta ilha não foy conhecida do mestre e piloto João Rabelo e mais oficiaes da não que me diserão que anadrão ja ali muito tenpo e esta jemte he a mais cheguado ao Cabo de Boa Esperamça. Não he de boa conversação por iso nos recebo mal. Fiquey esperando este meu batel a vela e as corremtes erão grandes meterão me de noite nos baixos de Santo António e diguo a Vossa Alteza que tive trabalho porque o tenpo com que entrey não era pêra sair e as correntes chamavão pêra dentro. Aprouve a Noso Senhor que acodio com sua mysericordia a tempo que a aviamos mister porque da sua partye não poode faltar nada principalmente aos que pretendem servi lo. Aquy trabalharão os fidalguos muito porque huns a bomba que trazia eu vinte hum furo aberto (1 v.) na minha não com que party desa cidade outros ao cabestante pêra desferir as velas outros virvão por recolher as amarras que tudo foy necesario num instante. Isto conto a Vossa Alteza pêra lhe pedir por mercê muy asinalada que este regimento mande tirara da viajens e não obrigue nhuma não a deitar o batel fora nas ilhas porque lhe diguo em verdade que corre muito risquo quem o deitar e a Ilha de Moçambique quem chegua a ela a vee de fora tudo o que esta dentro. Pasão as nãos por ahi senpre com tempo que os navios de remos não se lhe podem por diamte. Milhor he este aviso. Que os capitães de Sofala que quando ouver de que avisar tenhão hum barguãotin no Cabo das Correntes e as nãos podem trazer recado pêra se nesta parajem virem alguma vela esperarem por ela e se não a virem fazerem seu caminho e eu tenho mandado ja ao capitão de Sofala.


2- Cheguey a Moçambique. Achey a terra revolta por hum frade de São Francisco com parecer do viso rey em tempo de Bastão de Saa ter derribado huma misquita na povoação dos mouros de Moão dos mouros de Moçambique de que se eles escandalizarão e queimarão algumas cruzes e cravarão a artelharia grosa per treição da qual eu trouxe três camelos a esta cidade pêra terem algum remédio. Tinhão mortos ja dous homens per treição hum deles que vinha fazer foguo a não como he custume e outro tinha o alcaide moor mandão buscar mãotimentos. O princepe de Quiloa andava ja alevantado e deitado com os cafres a jente da terra estava amotinada e tomava por achaque que por que lhe não paguavão e trabalhvão nas obras. De Pantilião de Saa veio nova a sua molher que era morto de doemça em Sofala com todos os seus. Parte disto era asi porque ele esteve muy ao cabo e dos seus lhe morrerão muitos. Não deixarey de guabar a Vossa Alteza esta molher porque verdadeiramente que mostrou nestes trabalhos ser pêra muito porque acodia a todas as cousas como hum bom capitão e sobretudo quis me aguasalhar bem (e fe lo). Manoel Pinto alcaide moor fazia tãobem o que podia no serviço de Vossa Aletza senão que lhe tachey eu o que fazia demasiado porque prendia mouros a torto e a direito e algumas (2) cousas destas escandalizava mais a terra. Foi me necessário por todas estas cousas e o capitão estar em Sofala guastar nesta terra sadia trinta e dous dias com as minhas cinquo nãos que custarão muito a my e nada VossaAlteza e quando aquy cheguey trazia um so doemte quando parti foy com mais de duzentos. Deixey a terra soseguada desta maneira. Soltey alguns mouros mal presos mandey deitar preguões com promesas grandes de quem me decobrise o cravar da artelharia. Trazia huma pouqua de prata em que comia. Fiz nela três mil e seiscentos cruzados com que paguey e aseseguey a jente da obra e ouve por milhor veniagua servir Vossa Alteza com ela neste tenpo que vende la en Bemgala. Neste tenpo que aqui guastey veio ter comingo hum enbaixador de Melinde que não vinha a mym. Trazia nova somente ao capitão do alevantamento do pricepe de Quiloa e dos roubos que tinha feitos e a terra como estva desasosgeguada. Tudo isto remedeey o milhor que pude com lhe daar algumas provisões que me pedio que me parecerão necesarias e asy o espedy.


3- Neste mesmo tenpo veio ter comigo hum mouro muito homrrado de Cuama e tanbem não vinha a mym. Chama se Mingoaxane ha se por prinecpe e cuida ele que o he. Seu intento era vir desculpar a morte de Dom Guonçalo e tanben enformara se da terra o como estava porque lhe dizião laa que estava perdida e trazia novas de Francisco Barreto quando ali arribou dizer que tanto que cheguasse laa avia de pedir a Vossa Alteza jente e vir conquistar aquela terra. Todos este pemsamentos lhe desfiz como me pareceo serviço de Vossa Alteza. Ele foy respondido ao todo e descansado do espirto. Não escrevo particularmente a Vossa Alteza o que com ele pasey por algumas perluxidades compridas finalmente que eu o escrevo laa quem o fará saber a Vossa Alteza.


4- Como cheguou Pantilião de Saa dise lhe algumas cousas que avia de fazer e outras que não avia de fazer. Nestas entrou a fortaleza porque não ouve por serviço de Vossa Alteza fazer se daquela maneira não diguo acrecemtado nem deminuido na traça senão no modo. Mandey somente que ajuntasse muita pedra e cal e ate se não acabar a fortaleza nimguem fizse casa de pedra e cal porque com este achaque avia alguma falta nas obras de Vossa Alteza e como tivese as acheguas juntas que mo fizese saber pêra então mandar entender na obra com mais brevidade (2v.) e menos custo porque he graça dizer se a fortaleza que fez Dom Diogo e depois dele guastou três anos de Bastão de Saa e três de Pantilião de Saa e daquy a seis não poode ser acabada na hordem que leva porque são perto de vimte mil braças que se punhão en quatorze. Não são feitas mais de seis. Cada braça destas custa a Vossa Alteza dous mil e quatrocentos reais. Laa lhe mando a traça do feito e por fazer. Com deixar isto feito me party pêra esta cidade a 10 d'Agosto e cheguei aquy aos 9 de Setenbro como ja digo a Vossa Alteza, Fuy bem recebido da terra com pouquos guastos como me Vossa Alteza tinha encomendado porque lho mandey pedir asi do maar e também como cheguey entrei ao outro dia e não lhe quis daar tenpo pêra mais. O viso rey Dom Constantino me emtregou esta cidade como vio o mandado de Vossa Alteza. O que me nela entregou e como ela estava deve ser o que ele mostrar a Vossa Alteza por certidão minha asinada pormym. (...)


5- (3 v.) (...) Por me não ficar desarmada a costa de Malavar e por ter aviso dalgumas espias que por eses rios traguo que en alguns deles se carreguavão algumas nãos de pimenta mandey Manoel Travaços com sete ou pito fustas andar nesta costa ate vir ter com ele Dom Francisco Mascarenhas a quen tenho dado este carguo e depois de sua cheguada ira Manoel Travaços a costa de Melinde com quatro fustas porque asy ao serviço de Vossa Alteza por ser informado que anda aquela costa muy devas asi de portugueses como de mouros. Isto causou (4) estar per contrato Melinde por hum pouquo de breu que se ali dava e por isto estar arrendado não hia la nimguem e por não ir nimguem por mndao de Vossa Alteza hia laa todo mundo contra seu regimento e o capitão de Sofala e o de Chaul estão de pose de Chaul ate o Cabo das Correntes. Nisto ha muito que dizer. Não faltara laa quem o faça saber a Vossa Alteza. Como esta armada foy espedida fiz logo prestes Jorge de Moura com três gualeões e dous navios de remo ao monte de Félix omde o mando esperar esta pimenta e dahi invernar a Ormuz por ser asi necesario. Agora darey conta a Vossa Alteza do por onde não ha pimenta e tenção destas armadas que mando. (...)

(8v.) (...) O capitulo trinta en que Vossa Alteza manda que os capitães de Sofala não manden navios a costa de Melinde asi o tenho provido. (...)

Alguns bicos meus hão de pedir laa a Vossa Alteza em meu nome. Vossa Alteza me faraa mercê comcedermos se ouver que lhos mereço e se não ficar ma a resguardado trabalhar por lhos merecer.

Noso senhor a vida e real estado de Vossa Alteza prospere e defenda como deseja.

Desta cidade de Goa a 20 de Dezenbro de 1561.

Conde Vyso Rey

National Archives of Rhodesia, Centro de Estudos Históricos Ultramarinos da Junta de Investigação Científicas do Ultramar: DOCUMENTOS SOBRE OS PORTUGUESES EM MOÇAMBIQUE E NA AFRICA CENTRAL ( Vol III) - Lisboa 1975