ADIASPORA.COM II ANIVERSÁRIO

“TRAÇANDO O SONHO NA TELA DA DIÁSPORA”

 

Por José Mário Coelho

Para já, os meus parabéns ao José Ilídio Ferreira pelo 2° Aniversário da sua “Adiaspora.com”.

 

É sempre bom sabermos que “Gente da Nossa Gente” sonha e realiza algo de positivo. A minha saudação amiga ao painel de académicos presentes. Não é fácil juntar tanta gente conhecedora de uma só vez. Também, por isto, o José Ferreira e seus colaboradores merecem felicitações. Naturalmente, no meio deste académicos, eu sinto-me a mais, vou destoar... as minhas desculpas, desde já, pela fraca prestação deste vosso amigo que, embora com boa vontade, não tem o sumo e a qualidade dos convidados da “Adiaspora.com”. Mas pelo menos, tenho uma vantagem sobre a maioria dos membros desta reunião de hoje e com um tema excitante para quem vive longe da sua raiz.

 

“Traçando o Sonho na Tela da Diáspora”...

 

Todos nós partimos de Portugal com a mala cheia de sonhos. Alguns, até, nem mala trouxeram, apenas o sonho os acompanhou. Aqui, julgo eu, a minha vantagem, para falar de nós e das nossas coisas. É que possuo uma experiência riquíssima, adquirida no dia a dia com todos vós, sofrendo as mesmas dores, rindo das mesmas histórias, avançando à medida que o destino de imigrante permitia...

 

Não estou aqui como Delegado Permanente da Comunidade Madeirense, nem sequer como membro da comunicação social. Estou aqui só e apenas como membro da minha comunidade, a Comunidade Portuguesa da Grande Área de Toronto. E o portal “Adiaspora.com”deu-me o motivo para o que vos quero transmitir. É exactamente a diferença entre a tecnologia que leva a “Adiaspora.com” a quem quiser usufruir dessa vantagem em suas casas ou escritórios e, a cada vez mais difícil tarefa das colectividades portuguesas, tal como esta em que nos encontramos e que ajudei a dar vida durante muitos anos. Quando me pediram para falar no 25° Aniversário do Lusitânia de Toronto, eu falei ao de leve na crise clubística e do semanal “Baile das Maminhas”... Muita gente riu, achou piada, não valorizou a situação pelo seu real sentido mas, sim, apenas pela graça da ideia. Pois, meus amigos, cada vez temos mais “Bailes das Maminhas” nos nossos clubes e associações... é ver boa parte das senhoras dançando umas com as outras, e os cavalheiros conversando e bebericando uma bebida ao balcão, enquanto o salão se apresenta perto do vazio. Vazio! Vazio, uma palavra que os obreiros e voluntários das colectividades portuguesas têm de pôr na mente. Vazio, porquê? Os salões estão quase vazios porque existe hoje um grande vazio de conteúdo, um grande vazio de ideias, um grande vazio de atracção nos clubes e associações. É por isso que os salões de festas e associações se esvaziaram aos poucos porque, se ontem havia uma necessidade absoluta da mais pequena diversão, tudo servia, tudo matava saudades, hoje...já não é assim.

 

Os filhos cresceram, as famílias integraram-se, os homens e mulheres, os homens e mulheres de boa vontade, que se sacrificavam até à exaustão pelos clubes da sua região envelheceram, outros morreram e, os mais novos não sentem necessidade de clubes que continuam a viver no passado e do passado! Vale a pena manter estas instalações onde nos encontramos, se estão fechadas a maior parte dos dias da semana e, ao fim-de-semana, com raras e honrosas excepções, dão lugar aos tais “Bailes das Maminhas” que, de uma forma geral, não dão para pagar as despesas do clube, mês após mês? E os membros dos corpos gerentes têm, por vezes, de pagar do bolso determinadas despesas. Para além de todos os sacrifícios, pessoais e familiares, ainda o risco económico, tudo isto sem a mais pequena recompensa, às vezes até são desprezados pelos seus pares, isto para não acrescentar outras ofensas...

 

Não tenho o saber dos convidados da “Adiaspora.com”, mas tenho uma experiência nesta comunidade que julgo válida e tenho também a obrigação de, sem beliscar minimamente o trabalho valioso feito até aqui pelos clubes, de chamar a atenção de todos para as mudanças que são necessárias encetar para que o vazio já descrito deixe de existir.

 

Seria utopia da minha parte, imaginar uma comunidade equilibrada com toda a perfeição possível mas, tentar fazer melhor, não é impossível. Temos excesso de clubes e, como tal, uma perda enorme de energias úteis, dificuldades acrescidas de encontrar as pessoas certas para os lugares certos. Era, talvez, ideal termos uma valiosa “Casa de Portugal”; uma bem apetrechada “Casa dos Açores” que desse guarida à gentes das nove ilhas;  uma “Casa da Madeira” como aliás já acontece e com êxito; uma boa “Casa do Minho” com a alegria e a energia que os minhotos dão a tudo em que se metem; uma “Casa das Beiras”, que também já temos com bons alicerces e em franco crescimento; também, mater, a já veterana “Casa do Alentejo” que tão bons frutos tem dado; porque não uma “Casa do Centro e Sul”, para harmonia do todo? Naturalmente, haveria sempre lugar para alguns dos clubes e associações hoje existentes. De uma forma ou de outra, não podemos esquecer esta grande verdade: temos excesso de clubes! Os pequenos clubes ligados ao futebol amador e outras especialidades específicas, são auto-suficientes, não entram nesta questão. Não tenho a pretensão de vos dar a cura ou até o remédio que atenue a crise, mas sinto o dever de deixar aqui algumas hipóteses que refuto de benéficas e capazes e ajudar.

 

-Então como dar a volta a esta situação crítica dos clubes da nossa comunidade, partindo do princípio que tudo vai continuar com até aqui?

 

- Como manter o clube activo e justificar os sacrifícios  dos seus dirigentes?

 

Começo por dizer que, o tal “Baile das Maminhas” deve continuar, mesmo que o ganho da festa não dê para pagar ao conjunto musical ou ao “DJ” de serviço. Tudo serve para manter as pessoas unidas, divertidas, dialogando umas com as outras. Esta parte do diálogo é muito importante. Possivelmente nunca se preocuparam com isto mas, uma das grandes dificuldades dos portugueses, é não se conhecerem uns aos outros. Reparem:

 

-Quantos madeirenses conhecem o continente português e as ilhas dos Açores?

-         Quantos açorianos conhecem os Açores?

-         Desafio aos presentes na sala: Quantos de vós conhecem as 9 ilhas do arquipélago açoriano?

Eu sinto-me um felizardo, já visitei todas as ilhas dos Açores, do arquipélago da madeira e o continente de Norte a Sul. Foi tudo o que ganhei em levar o “cabaz de Natal do Imigrante” do Canadá ao continente, Madeira e Açores. Foi um grande sacrifício mas, como disse, compensador e enriquecedor.

 

Continuando: - Quantos açorianos conhecem a Madeira e o continente português? E, para finalizar esta parte, quantos continentais conhecem os arquipélagos da madeira e Açores? Quer queiram, quer não, esta é uma das razões de certas crises de identificação e união entre nós. Nós não nos conhecemos uns aos outros! Como conhecer as pessoas sem conhecer o território. E, uma das grandes missões das colectividades, é dar a conhecer Portugal aos portugueses. Daí, ser importante o convívio e, acima de tudo, as tão necessárias “Semanas Culturais” que todos os anos acontecem entre nós. A missão mais nobre das colectividades, para além das mencionadas e conhecidas, é prolongar Portugal na diáspora e manter a língua portuguesa, procurando incentivar nos mais jovens o gosto e a necessidade de falar a língua de Camões. Os clubes não são fábricas de dinheiro, são organizações não lucrativas, devem usar os ganhos na cultura, no recreio e na educação. Desta maneira, as famílias voltarão às salas dos clubes e associa­ções, para preencher o vazio de agora!

 

Talvez o tema, “Os Portugueses não se conhecem uns aos outros” seja motivo de estudo para os académicos aqui presentes....

 

Prosseguindo as nossas ideias sobre o assunto que aqui estou a abordar, gostaria de dizer abertamente aos dirigentes que me possam escutar que, talvez não seja ainda tarde, chamar os mais jovens para dentro do clube. Vejam os bons exemplos que são, o Centro Cultural Português de Mississauga, as Bandas Filarmónicas Portuguesas, os Ranchos Folclóricos e as Associações de Estudantes. Os jovens sabem o que querem, o problema é que não os deixam movimentar-se à sua maneira e ao som dos tempos que correm. Deixem os jovens divertirem-se connosco, tocando, cantando, fazendo teatro, etc....

 

Eles, os jovens, é que são os dirigentes de amanhã. Não tenham medo da juventude, eles não tiram os vossos lugares, apenas querem preparar-se para o futuro, para vos substituir na altura própria! Esta sala fechada, vazia, de nada serve. Estas salas devem estar abertas, prontas para dar rendimento cultural, recreativo e económico. Porque razão esta sala vazia não se enche de crianças durante a semana? Não seria útil, ter uma trabalhadora social – ou um membro do clube – a tomar conta das crianças, dando assim ajuda aos pais e sócios do clube, que trabalham e são forçados, por vezes, a deixarem os filhos em casa desconhecidas e a pessoas estranhas? Ora, os sócios desta casa, poderiam usufruir dos serviços e destas instalações por um preço mais acessível e com mais confiança. E as crianças que aqui fossem crescendo, seriam os sócios, os amigos, os dirigentes de amanhã.

 

Quantos reformados temos entre nós. Milhentos! Já notaram que entre os sócios do clube têm vários idosos, reformados, ainda capazes de olhar pelas instalações e conviverem com outros idosos, jogando às cartas, conversando e também, importante, dando lucro ao clube? Porque não abrir as portas aos idosos e acolherem-nos com carrinho, aqui dentro, fazer desta casa a sua casa, nem que seja por meia dúzia de horas diárias? Não só eles, como os seus familiares, ficariam muito mais descansados e felizes... Mais ainda: os governos, federal e provincial, dão subsídios aos clubes e associações para estes casos, como é exemplo, o Centro Cultural Português de Mississauga e o First Portuguese....Porque no leccionar aqui dentro a língua portuguesa, ou dar aulas de cidadia canadiana? Há professores, há subsídios, porque esperam?

 

As crianças e os idosos precisam da nossa atenção, dos nossos cuidados, e os clubes não podem fugir a esta realidade. O marasmo existente tem de terminar.

 

Será difícil conseguir mestres para ensinar os mais jovens na iniciação musical, nos primeiros passos folclóricos e nas cenas teatrais? Minhas senhoras e meus senhores, encham estas salas de gente, há imensa matéria prima entre nós. Todos viram, tenho a certeza, no último Carnaval, a quantidade de músicos, cantores e intérpretes teatrais dos vários clubes da Província, que nos deliciaram com o “Carnaval à Moda da Terceira”...onde estão esses artistas cheios de talento? Por aí, esquecidos, sem margem para o sonho, sem poderem “Traçar o Sonho na Tela da Diáspora”, porque os clubes têm as portas fechadas, as salas vazias!

 

Os clubes, nos dias de hoje, podem e devem ser escolas de formação, dando continuidade às tradições e a servir de “elo mais forte” ao conhecimento dos portugueses entre si. Isto, para além de escolas de virtudes!

 

Estamos numa época de viragem. A juventude luso-canadiana, se não for agora cativada para a comunidade portuguesa, possivelmente vai ser absorvida em prol do país de acolhimento. O papel dos clubes, associações e paróquias são, neste momento crucial, imprescindíveis. Se não olharmos por nós, ninguém mais o fará. Se quisermos ganhar a juventude, temos que lhes abrir as portas...hoje! A última palavra é vossa!

 

OBRIGADO

José Mário Coelho

18 de Janeiro de 2004